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Habilitação Tardia de Créditos Trabalhistas e Decadência: Falência e Recuperação Judicial

A execução de créditos trabalhistas em processos de falência ou recuperação judicial é um tema de grande relevância e complexidade no direito brasileiro, especialmente em razão das implicações para os direitos dos trabalhadores e a ordem dos credores. 


A legislação, especialmente a Lei nº 11.101/2005, conhecida como Lei de Recuperação Judicial e Falências, estabelece regras específicas sobre a competência para a execução desses créditos e os procedimentos a serem seguidos para a habilitação no quadro geral de credores. 


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem desempenhado um papel crucial na interpretação dessas normas, definindo diretrizes claras sobre quando e como os créditos trabalhistas devem ser encaminhados ao juízo universal. 

Este artigo aborda os principais aspectos desse tema, examinando os prazos, procedimentos, e as questões envolvendo a reserva de valores e a habilitação retardatária de créditos, com base na legislação vigente e nos entendimentos jurisprudenciais atuais.

Quando as Ações Trabalhistas Devem Ser Encaminhadas ao Juízo Universal?

A questão da competência para a execução de créditos trabalhistas em processos de falência ou recuperação judicial é tema de ampla discussão e relevância no direito brasileiro. 


O entendimento predominante, consolidado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é que as ações trabalhistas devem ser encaminhadas ao juízo universal após a liquidação do crédito. 


Essa diretriz visa garantir a uniformidade na administração dos créditos e a paridade no tratamento dos credores, conforme decisão no Conflito de Competência 37.680/PR.

O STJ reafirma que, mesmo quando já houve a constrição de bens em execuções trabalhistas, é o juízo universal que possui competência para prosseguir com os atos executórios, conforme estabelecido nos Embargos de Declaração no Conflito de Competência 95.639/GO. 


Após a liquidação do crédito, a Justiça do Trabalho deve expedir uma certidão de habilitação para que o crédito trabalhista seja incluído no quadro geral de credores da falência, conforme a classificação e preferência legal (Agravo Regimental no Conflito de Competência 89.223/RJ).


Qual o Papel da Reserva de Valor na Recuperação Judicial?

A Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei nº 11.101/2005), em seu artigo 6º, §3º, prevê que o juiz competente para as ações trabalhistas pode determinar a reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência.

“§ 3º O juiz competente para as ações referidas nos §§ 1º e 2º deste artigo poderá determinar a reserva da importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência, e, uma vez reconhecido líquido o direito, será o crédito incluído na classe própria.”


Uma vez reconhecido líquido o direito, o crédito será incluído na classe apropriada. Esse dispositivo tem o objetivo de proteger os interesses dos credores trabalhistas, assegurando que, caso o reclamante vença a ação trabalhista, haverá uma reserva de valores para satisfazer a condenação.


É fundamental que o trabalhador ou seu representante requeira ao Juízo do Trabalho a comunicação ao Juízo Universal sobre a necessidade de reserva de valores. 

Contudo, não há na lei uma previsão expressa sobre as consequências da ausência dessa comunicação, o que poderia implicar em discussões sobre eventuais nulidades.

Quais os Prazos e Procedimentos para a Habilitação de Créditos?


O processo de habilitação de créditos em falências é regulamentado pela Lei nº 11.101/2005. De acordo com o artigo 7º, a verificação dos créditos é realizada pelo administrador judicial com base em livros contábeis, documentos comerciais e fiscais do devedor, além dos documentos apresentados pelos credores. Após a publicação do edital, os credores têm 15 dias para apresentar suas habilitações ou divergências.


Art. 7º A verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas.

§ 1º Publicado o edital previsto no art. 52, § 1º , ou no parágrafo único do art. 99 desta Lei, os credores terão o prazo de 15 (quinze) dias para apresentar ao administrador judicial suas habilitações ou suas divergências quanto aos créditos relacionados.

§ 2º O administrador judicial, com base nas informações e documentos colhidos na forma do caput e do § 1º deste artigo, fará publicar edital contendo a relação de credores no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, contado do fim do prazo do § 1º deste artigo, devendo indicar o local, o horário e o prazo comum em que as pessoas indicadas no art. 8º desta Lei terão acesso aos documentos que fundamentaram a elaboração dessa relação.


Se o administrador judicial constatar a ausência de algum crédito ou credor, ou se houver erros na relação de credores, esses podem apresentar impugnação ao juiz no prazo de 10 dias a partir da publicação do edital. 

O procedimento segue o rito previsto nos artigos 13 e 15 da lei. 

Art. 13. A impugnação será dirigida ao juiz por meio de petição, instruída com os documentos que tiver o impugnante, o qual indicará as provas consideradas necessárias.

Parágrafo único. Cada impugnação será autuada em separado, com os documentos a ela relativos, mas terão uma só autuação as diversas impugnações versando sobre o mesmo crédito.

Art. 15. Transcorridos os prazos previstos nos arts. 11 e 12 desta Lei, os autos de impugnação serão conclusos ao juiz, que:

I – determinará a inclusão no quadro-geral de credores das habilitações de créditos não impugnadas, no valor constante da relação referida no § 2º do art. 7º desta Lei; II – julgará as impugnações que entender suficientemente esclarecidas pelas alegações e provas apresentadas pelas partes, mencionando, de cada crédito, o valor e a classificação; III – fixará, em cada uma das restantes impugnações, os aspectos controvertidos e decidirá as questões processuais pendentes; IV – determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário.


A habilitação tardia dos créditos, prevista no artigo 10, não implica na perda do direito pelo credor, mas sim em seu recebimento como retardatária, desde que dentro dos prazos e procedimentos estabelecidos.


Como a Jurisprudência Trata a Decadência na Habilitação de Créditos?

A jurisprudência recente do STJ tem se debruçado sobre a questão da decadência na habilitação de créditos, especialmente após as alterações introduzidas pela Lei nº 14.112/2020. 


O artigo 10, §10, da Lei nº 11.101/2005, passou a prever um prazo de 3 anos para que o credor apresente o pedido de habilitação ou de reserva de crédito, contado da data de publicação da sentença que decreta a falência. Esse prazo tem natureza decadencial, conforme entendimento consolidado.

“O credor deverá apresentar pedido de habilitação ou de reserva de crédito em, no máximo, 3 (três) anos, contados da data de publicação da sentença que decretar a falência, sob pena de decadência.”

No entanto, a aplicação desse prazo para processos em curso à época da vigência da nova lei tem gerado debates. A jurisprudência tem adotado a teoria tempus regit actum, determinando que o prazo de 3 anos seja contado a partir da entrada em vigor da nova lei, e não retroativamente. 

Decisões como as dos Agravos de Instrumento 2328965-75.2023.8.26.0000 e 2150564-88.2022.8.26.0000, ambas do Tribunal de Justiça de São Paulo, afastam a decadência com base nesse entendimento.


Falência. Incidente de habilitação retardatária de crédito. Decisão que reconheceu a decadência do direito. Inconformismo do credor. Acolhimento. O prazo previsto no art. 10, § 10, da Lei 11.101/2005, introduzido pela Lei n. 14.112/2020, deve ser contado a partir da vigência do novo normativo, em relação às falências anteriormente decretadas. Jurisprudência das CRDE, deste E. Tribunal. Decadência afastada, com determinação de prosseguimento da habilitação de crédito na origem, para verificação do valor devido, até a data da quebra. Decisão reformada. Recurso provido, com determinação. (TJ-SP - Agravo de Instrumento: 2328965-75.2023.8.26.0000 São Paulo, Relator: Grava Brazil, Data de Julgamento: 19/03/2024, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 19/03/2024)

"FALÊNCIA – Habilitação de crédito – Hipótese em que foi reconhecida a decadência nos moldes do art. 10, § 10º, da Lei 11.101/05 – Impossibilidade – Incidente ajuizado antes da entrada em vigor da Lei 14.112/2020 e alterações promovidas na Lei de Falencias – 'Tempus regit actum' – Precedente - Sentença anulada – Recurso provido." (TJ-SP - AI: 21505648820228260000 SP 2150564-88.2022.8.26.0000, Relator: J. B. Franco de Godoi, Data de Julgamento: 27/10/2022, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 27/10/2022)

Observe, o mencionado se aplica para falências, existindo quase nada nos tribunais sobre RJ.


Pode Ocorrer Habilitação Retardatária no Quadro Geral de Credores?

A habilitação retardatária de créditos não impede a participação do credor no processo de falência, mas modifica sua posição na ordem de recebimento. 


Conforme o artigo 10, §6º da Lei nº 11.101/2005, as habilitações retardatárias recebidas antes da homologação do quadro-geral de credores são tratadas como impugnações, integrando o quadro após decisão judicial. 

Já as habilitações recebidas após a homologação requerem ação própria para retificação do quadro-geral.


O §10 do artigo 10 estipula um prazo máximo de 3 anos para que o credor faça essa habilitação, sob pena de decadência. 

Contudo, a jurisprudência também estabelece que o quadro-geral de credores pode ser alterado até o encerramento do processo falimentar, por meio de ação ajuizada pelo administrador judicial, qualquer credor, o comitê de credores ou o Ministério Público, com respaldo no artigo 19 da mesma lei.


Assim, a complexidade dos procedimentos e prazos para habilitação e impugnação de créditos em falências e recuperações judiciais exige atenção rigorosa por parte dos credores, a fim de assegurar seus direitos no processo.



A gestão de créditos trabalhistas em processos de falência ou recuperação judicial é uma área crítica que exige atenção meticulosa às normas legais e aos prazos estabelecidos. 

A legislação brasileira, amparada pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, busca garantir a ordem e a equidade entre os credores, assegurando que os créditos sejam corretamente habilitados e que a liquidação seja conduzida de forma justa. A reserva de valores e a habilitação de créditos, mesmo quando realizada de forma tardia, são mecanismos essenciais para a proteção dos direitos dos trabalhadores. 


O conhecimento preciso dessas regras e a correta aplicação das mesmas são fundamentais para assegurar que os interesses de todas as partes envolvidas sejam adequadamente representados e preservados no âmbito dos processos falimentares e de recuperação judicial.

Em qualquer caso, a orientação de um advogado especializado é fundamental para avaliar a viabilidade de uma ação judicial e garantir a proteção dos seus direitos.


 É importante lembrar que as informações aqui apresentadas não substituem a orientação jurídica personalizada, e para obter informações mais detalhadas sobre o assunto tratado neste artigo, é aconselhável consultar um advogado especialista.

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